Injuria Racial – Campos & Antonioli Advogados Associados https://camposeantonioli.com.br Direito Penal Econômico Tue, 22 Aug 2023 21:58:57 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.8.1 https://camposeantonioli.com.br/wp-content/uploads/2022/12/favicon.png Injuria Racial – Campos & Antonioli Advogados Associados https://camposeantonioli.com.br 32 32 Crime e castigo: Congresso aprova projeto que endurece punições contra racismo, injúria racial e outras formas de descriminação https://camposeantonioli.com.br/punicoes-contra-racismo-injuria-racial/ Tue, 03 Jan 2023 13:35:12 +0000 http://sgprime.pro.br/camposeantonioli.com.br/?p=2051 Para Sócrates Suares, o maior desafio da sociedade será a correta interpretação, fiscalização e aplicação da lei, para que realmente “pegue”

Após sete anos de discussão no Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto que estabelece punições mais severas para aqueles que praticarem injúria racial. O texto, que aguarda a sanção presidencial, modifica a Lei do Crime Racial (Lei 7.716, de 5 de janeiro de 1989) e o Código Penal (Decreto Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940). Trata-se de um substitutivo do Senado Federal ao Projeto de Lei nº 1749/15, de autoria dos deputados federais Tia Eron e Bebeto, que contou com parecer favorável do relator, o deputado Antonio Brito. 

“A matéria já vinha sendo discutida no Congresso desde 2015 e foi aprovada pela Câmara dos Deputados e encaminhada ao Senado em novembro de 2021”, explica o criminalista Sócrates Suares, sócio do escritório Campos e Antonioli Advogados Associados, em artigo publicado recentemente pelo Estadão. 

 

“A aprovação desta lei, que agora aguarda apenas a sanção presidencial, é um importante avanço na conscientização e no combate ao racismo e ao preconceito”, defende o advogado, esclarecendo que a medida “fortalece a legislação vigente ao aumentar a pena para quem cometer o crime, além de contemplar situações específicas em que este pode ser praticado, como na internet, nas mídias sociais, em jogos de futebol, em shows de stand-up comedy, por agentes de segurança bancária e de transporte de valores”.

 

O advogado conta que no Senado Federal o texto passou por diversas alterações, que aumentaram o escopo da proposta original. “A matéria foi aprovada e o projeto retornou à Câmara sob a forma de substitutivo em maio de 2022, sendo a redação final do projeto votada e aprovada no último dia 7 de dezembro.”

A proposição modifica o Código Penal ao remover a prática de injúria racial – isto é, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional – e incorporá-la à Lei nº 7.716/89. “Essa alteração majora a pena mínima, antes prevista de 1 a 3 anos, para pena de reclusão de 2 a 5 anos e multa; prevê ainda o aumento pela metade da pena se o crime é cometido por duas ou mais pessoas”, esclarece o criminalista, que vai além: “o projeto acrescenta no parágrafo 2º do artigo 20 da referida Lei a previsão de cometimento do crime por intermédio de publicação em redes sociais ou da rede mundial de computadores, com pena de reclusão de 2 a 5 anos”.

Caso o delito ocorra em ambiente ou contexto de atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais destinadas ao público, Suares pontua que, em acréscimo à pena de reclusão de 2 a 5 anos, aquele que praticar o crime será proibido por 3 anos de frequentar locais destinados a práticas esportivas e artísticas. “Com certeza a proibição tende a desestimular torcedores e outros envolvidos que venham a cogitar realizar novas práticas racistas.”

A nova legislação também tipifica como racismo o ato de obstaculizar, impedir ou praticar violência contra qualquer forma de manifestação ou prática religiosa. Além disso, determina que todos os crimes previstos na lei terão suas penas acrescidas entre 1/3 e 1/2 caso sucedam “no contexto ou com o intuito de descontração, diversão ou recreação ou quando praticado por funcionário público, no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las”.

Conforme a regra, o juiz deverá considerar discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado a pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida – e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência. Com relação à fase processual, tanto em varas cíveis quanto criminais, a vítima de racismo deverá ser acompanhada por um advogado ou defensor público.

“Contudo”, pondera Suares, “ao passo que o Legislativo atualiza a lei penal para os dias atuais, a interpretação e aplicação correta da lei e, principalmente, a fiscalização da proibição de frequência serão os desafios de toda a sociedade, a começar pelos operadores do Direito, para que a lei realmente ‘pegue’ e cumpra o seu papel de punir aqueles que, em pleno século 21, praticam qualquer tipo de racismo ou discriminação”.

Racismo Estrutural

 

O conceito de racismo estrutural engloba uma série de hábitos, gafes, práticas e falas do dia a dia que reforçam, mesmo que inconscientemente, a discriminação e o preconceito racial. Podem ser expressões pejorativas, que inferiorizam pessoas por cor, raça ou etnia, ou piadas que utilizam do humor para menosprezar determinados grupos ou pessoas.

Estatísticas assustadoras

 

Somente em São Paulo, os casos de discriminação racial registrados pela Secretaria de Justiça e Cidadania no 1º semestre de 2022 já ultrapassaram o total de casos dos dois anos anteriores. Foram registrados 265 casos de discriminação pelos canais de denúncia da pasta, mais do que as 251 denúncias contabilizadas entre 2019 e 2021.

De acordo com dados de 2021 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre os 212,7 milhões de brasileiros, 47% se identificam como pardos, e 9,1%, como pretos. Também de acordo com o IBGE, esse grupo representa 70% da população abaixo da linha da pobreza.

O 16° Anuário Brasileiro de Segurança Pública apontou que em 2021, entre as mortes violentas intencionais, 78% foram de negros, e 21,7%, de brancos. Já com relação às mortes causadas pela polícia, essa discrepância se torna ainda maior: 84% dos mortos em operações policiais são negros. Comparando 2021 com o ano anterior, enquanto esse indicador apresentou queda de 31% entre a população branca, houve um acréscimo de 5,8% entre pretos e pardos.

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Justiça sem cor: apesar dos avanços, racismo e injúria ainda estão muito presentes na sociedade https://camposeantonioli.com.br/racismo-e-injuria-ainda-estao-muito-presentes-na-sociedade/ Mon, 19 Dec 2022 12:17:21 +0000 http://sgprime.pro.br/camposeantonioli.com.br/?p=2021 Douglas Antonioli fala sobre as consequências da discriminação em ambientes de trabalho e detalha as diferenças legais entre racismo e injúria

Condutas criminosas passíveis de penalização, racismo e injúria racial, infelizmente, ainda são comuns no Brasil, visto que pessoas continuam discriminadas em função da cor da pele, sobretudo quando exercem funções tidas como subalternas. O criminalista Douglas Antonioli, sócio do escritório Campos e Antonioli Advogados Associados, explica que, não obstante os avanços, há resistência em setores da sociedade e do empresariado às iniciativas em prol da igualdade.

“Embora as empresas, nos dias atuais, tenham criado políticas com o intuito de promover o combate à discriminação, ao racismo, ao assédio e a outras formas de opressão exercidas sobre os empregados, existem aqueles empregadores que são indiferentes a essa nova postura, a essa nova realidade – e que demonstram preconceito em relação ao trabalhador”, lamenta Antonioli. “Esse dado pode ser verificado na grande incidência na Justiça do Trabalho de processos que denunciam a prática do racismo e da injúria racial no ambiente de trabalho.”

A legislação brasileira, seguindo normas e acordos internacionais, proíbe explicitamente a prática de preconceito ou discriminação racial por parte de empregadores ou cidadãos. “A Constituição faz referência expressa à Convenção nº 111/58 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que foi ratificada pelo Brasil e promulgada por decreto, estabelecendo a eliminação de toda discriminação em matéria de emprego, incluindo a racial”, destaca o especialista.

Ele relata que a Justiça do Trabalho tem aceitado a rescisão indireta como justa causa do empregado em caso de discriminação racial pelo empregador – “que é considerada um crime de injúria racial”. Antonioli também menciona que é possível propor ações que busquem apenas a indenização nesse âmbito trabalhista.

No entanto, o advogado ressalva que cabe à vítima provar a prática: “o ônus da prova é do empregado, quando ele quer constituir o seu direito. Portanto, ele deverá comprovar que efetivamente ocorreu o crime de injúria racial”.

No caso da indenização trabalhista, ela deve ter propósito compensatório, de modo a reparar a dor da vítima ao sofrer a discriminação – “e a Justiça não levará em conta a capacidade econômica do empregador para arbitrar a indenização”, enfatiza o criminalista.

Esse parâmetro da reparação – complementa – foi fixado para evitar pleitos que buscassem enriquecimento sem causa por parte do trabalhador. “Então, para fixar o valor, o que será observado é a capacidade econômica da vítima. Ou seja, o valor terá como referência as condições do empregado, e não do empregador.”

 

Injúria racial e racismo

De acordo com Douglas Antonioli, injúria racial é um crime com pena estipulada pelo Código Penal, de 1 a 3 anos de reclusão, tendo sido tipificada pela lei 7.716, de 5 de janeiro de 1989. “Originalmente, esse projeto tratava de injúria racial em locais públicos ou privados de uso coletivo. Hoje, a extensão do rol é maior.”

Antonioli reforça que, na injúria, a ofensa está associada ao uso de palavras depreciativas contra a pessoa. “Já no crime de racismo há uma conduta discriminatória contra um determinado grupo.”

Também o artigo 5º da Carta Magna – lembra Antonioli – estabelece que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, dispondo que a prática de racismo é crime inafiançável e imprescritível. “Daí foi introduzido, no Código Penal, no artigo 140, o crime de injúria, cuja pena é de detenção de 1 a 6 meses e multa.”

Segundo o criminalista, quando a injúria é praticada com referências à raça, cor, etnia, religião ou origem, a punição é agravada, passando a reclusão de 1 a 3 anos e multa. “É a Lei 7.716/89, que foi alterada recentemente pela Lei 9.459/1997 e define os crimes resultantes de preconceito de raça, cor, etnia, origem, religião ou em relação à pessoa idosa ou portadora de algum tipo de deficiência, tendo como vítima uma pessoa determinada.”

Comportamentos que podem configurar injúria racial ou racismo:

  • Proferir palavras ou frases com o intuito de ofender algum indivíduo ou grupo devido à sua raça, cor ou origem étnica;
  • Exprimir a crença de que uma determinada raça ou grupo étnico-cultural seja superior aos demais, levando à opressão de indivíduos e grupos;
  • Tratar de forma desigual pessoas ou grupos de diferentes raças ou etnias baseado em estereótipos negativos e preconceituosos;
  • Negar direitos e oportunidades a grupos ou indivíduos por questões de raça, cor ou origem étnica;
  • Se recusar a aceitar e respeitar diferenças socioculturais entre grupos e indivíduos de diferentes raças ou origem étnica;
  • Utilizar de violência física ou ameaças de agressão contra grupos e indivíduos devido à raça, cor ou origem étnica;
  • Propagar e promover cultura de ódio e discriminação contra indivíduos e grupos de raças ou etnias distintas.

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Racismo laboral: apesar de crime, injúria racial ainda é corriqueira em ambientes de trabalho https://camposeantonioli.com.br/crime-injuria-racial-em-trabalho/ Wed, 23 Nov 2022 16:23:32 +0000 http://sgprime.pro.br/camposeantonioli.com.br/?p=1926 Desde 2004, prática de injúria racial já motivou mais de 22 mil processos na Justiça do Trabalho

Injúria racial no ambiente de trabalho

 

A injúria racial no ambiente de trabalho é uma prática muitas vezes naturalizada como trivial, apesar de suas nefastas consequências no mercado: além da disparidade salarial, a população negra tem menores possibilidades de ascensão profissional para cargos de gestão – em empresas dos mais diversos segmentos –, sem contar a maior desocupação enfrentada por pretos e pardos. 

Estudo realizado pela empresa de jurimetria Datalawyer e publicado pela Folha de S.Paulo indica que vem ocorrendo uma escalada anual no volume de processos relacionados a acusações de injúria racial contra trabalhadores.

Conforme o levantamento, desde 2012, o racismo laboral gerou ao menos 22.511 processos na Justiça do Trabalho. Em 2018, foram 1.291 ações vinculadas a racismo ou injúria racial. Já em 2021, apenas no primeiro semestre, o total de processos saltou para 1.793. No mesmo período de 2022, esse número atingiu 2.042 casos – um crescimento absolutamente vertiginoso. 

O estado de São Paulo, de acordo com a pesquisa, possui o maior número de processos ativos atualmente: 3.754 ações. Em segundo lugar aparece o Rio Grande do Sul, com 1.238 casos citando racismo, preconceito racial, discriminação racial e injúria racial nos pedidos iniciais.

Múltiplas faces do racismo laboral

 

Além dos assédios mais nítidos – que se expressam através de comentários, constrangimentos e até xingamentos –, o racismo também se apresenta na falta de diversidade. 

A título de exemplo, há o caso de uma grande rede de laboratórios que foi condenada em 2020 a indenizar uma funcionária em R$ 10 mil por não contemplar pessoas negras em seu guia de treinamento. O manual em questão definia padrões de vestimenta, maquiagem e penteado, mas desconsiderava as características individuais das pessoas de pele preta e cabelos crespos. 

Há, ainda, episódios que chegaram a situações extremas, em que a prática assumiu a forma de violência física e até homicídio, como ocorreu no triste caso do jovem congolês Moïse Mugenyi Kabagambe, de 24 anos, que foi torturado e assassinado em um quiosque da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. O motivo, torpe, foi a exigência do pagamento atrasado de seu trabalho, no valor de R$ 200.

Recentemente, também ganhou repercussão o caso de Madalena Silva, de 62 anos, que trabalhou por 54 anos sem receber salários, sendo constantemente maltratada pela família que a “empregava” em Lauro de Freitas, na Região Metropolitana de Salvador. Ao ser entrevistada, Madalena chegou a chorar ao tocar a mão da repórter de uma emissora de televisão, tantos foram os traumas experienciados. “Fico com receio de pegar na sua mão branca”, disse.

Respostas da Justiça

 

Em diversas decisões, a Justiça do Trabalho vem buscando coibir a prática da descriminação ou racismo no ambiente de trabalho. No caso de Madalena Silva, a juíza do trabalho Vivianne Tanure Mateus acatou pedido do Ministério Público do Trabalho da Bahia e determinou o bloqueio de R$ 1 milhão em bens da família acusada de manter a idosa de 62 anos em situação análoga à de escravo. A ação ainda não foi julgada em definitivo, mas a magistrada estabeleceu que os responsáveis paguem à vítima um salário-mínimo mensal até a resolução definitiva da demanda. 

Em outro julgamento recente, a juíza do trabalho Dalva Macedo condenou a inspetora de uma instituição de ensino do Rio de Janeiro a pagar R$ 30 mil de indenização por danos morais a uma funcionária – então, jovem aprendiz – que, enquanto estava no banheiro, foi advertida a voltar com o “volume do cabelo mais baixo”. Rindo do próprio aviso, a inspetora afirmou que a ordem “para pentear o cabelo” havia partido de um superior.   

Para a juíza do trabalho, as testemunhas ouvidas e o relato da funcionária comprovaram o intuito da acusada de “constranger a reclamante, menor aprendiz, com ofensa preconceituosa e de conotação racista”. Escreveu a juíza: “não há dúvidas de que a empregada, que é abordada por um motivo desvinculado do trabalho, vê-se acuada no ambiente de trabalho, apreensiva e com medo de sofrer as represálias do empregador. Ademais, a conotação desrespeitosa ligada a uma característica afrodescendente agrava a situação da ré”.

Já no episódio que resultou no assassinato de Moïse, o Ministério Público do Trabalho (MPT) entrou com ação pedindo indenização de R$17,2 milhões contra os acusados e em favor da família do congolês. O processo diz respeito às condições de trabalho impostas ao imigrante antes de ter sua vida ceifada. “A denúncia aponta para o possível trabalho sem o reconhecimento de direitos trabalhistas, podendo configurar, inclusive, trabalho em condições análogas à de escravo, na modalidade trabalho forçado, de xenofobia e de racismo”, sustentou o MPT, na época.

Constituição Federal

 

A Constituição Federal de 1988 manifesta a repulsa ao racismo em duas passagens distintas. No artigo 4º, que estabelece os princípios que regem as relações internacionais do Brasil, figura no inciso VIII o “repúdio ao terrorismo e ao racismo”. 

Já o artigo 5º, que trata dos direitos e garantias fundamentais, coloca a “prática do racismo”, no inciso XLII, como “crime inafiançável e imprescritível”, que se sujeita “à pena de reclusão”. 

Antes disso, porém, em seu artigo 3º, a Carta Magna já impõe como “objetivo fundamental” da República, no inciso IV, “promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. 

Estatuto da Igualdade Racial

 

Sancionado após uma tramitação que durou quase uma década, o Estatuto da Igualdade Racial – instituído, finalmente, na forma da Lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010 – visa “garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades”, além de promover a “defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos” e o “combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica”.

O texto estabelece o direito da população negra de participar, em condições de igualdade de oportunidade, da vida econômica, social, política e cultural do país – por meio de políticas públicas de desenvolvimento e da adoção de medidas e ações afirmativas. 

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